Tempestade
Desce ao chão, amor, e pisa a terra nua
com os pés que já esqueceram o peso do corpo.
Aqui não há alturas nem fantasias
que suportem o vento – há apenas raízes,
gretas abertas pela sede,
e as minhas mãos,
pouco mais que oásis em chamas.
Eu não sou sombra de sonho,
nem cisne em água translúcida.
Eu sou feito de espinhos e vinho,
de frutos que sangram ao toque,
de palavras partidas que ecoam
como vidros ao sol.
Mas contigo…
Quero queimar a língua no gosto do mundo,
beber até o fundo de cada estação,
e mesmo nos dias de pedra,
abraçar a dor até que ela floresça.
Quero as noites descalças,
os cabelos tocados pelo sal das viagens,
o corpo desfeito como um rio
que só encontra o mar
na tua pele.
Dizes que guardas em ti
uma rocha muda,
mas vejo no teu peito um pássaro,
preso entre o grito e o voo.
Quisera eu libertá-lo,
roubar-te o equilíbrio
e fazer da tua vida um campo de tempestades.
Sei que te amo até no teu receio,
no gesto calculado, na tua medida exata.
Finjo ser margem para não engolir-te.
Mas só por agora.
O amor, meu bem,
não é um barco ancorado.
É vento, é fúria,
é a vontade do céu de tocar a montanha
e desabar sobre ela.
— Antônio Reis